quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Beverly Hills dos bairros de lata

Foi esta uma das expressões que ouvi no seminário sobre a Cova da Moura.Veio da boca do actor Pedro Carraca que, juntamente com a Cláudia Gaiolas, coordenou o projecto de um grupo de teatro dentro do bairro. A frase queria dar-nos a entender que, ao contrário de muito bairros, a Cova da Moura tem ruas amplas e largos imensos. Agência de viagens, lojas várias e cabeleireiros e restaurantes aos molhos. Basicamente a Cova é um bairro como outro qualquer. Só que lhe chamam crítico e não substituem as lâmpadas da iluminação pública quando estas se fundem...
Obviamente que viveram experiências maravilhosas e felizmente, ontem partilharam algumas connosco. Não tinha a mínima noção de que muitas das crianças da Cova, até aos 16 ou 17 anos fazem toda a sua vida dentro do bairro e nem Lisboa conhecem. A tal ponto que, num retiro que fizeram em Montemor, depararam-se com crianças que se sentiram inseguras em por nunca terem estado num espaço tão amplo.

Foi muito interessante ouvir estas pessoas que se dedicam e que ganham amor a estas causas e pessoas assumir que nem sempre correram bem as intervenções, mas que nunca ficaram por fazer. Este é, realmente, um terreno muito pantanoso.



Lieve é a senhora da foto. A senhora alemã que fundou o Moinho da Juventude. Foi viver para o bairro em 82 e num antigo fontanário, que servia as mais de 900 pessoas do bairro sem água canalizada, conheceu esta gente e iniciou a sua obra. Começaram por uma biblioteca (com mais de 700 leitores) e, mais tarde, veio o Moinho. A Lieve tem um brilhante discurso no seu português cheio de sotaque. A Cova da Moura é um lugar limite de pessoas limite que constantemente são confrontadas com situações limite. Limite é realmente uma palavra forte que aqui se aplica a tanta coisa...
Para que se vejam as barreiras que todos esgravatam, há um projecto para uma creche no bairro, que tem forma (de estudantes de arquitectura), que tem terreno (da misericórdia), que tem financiador (um particular), mas que não existe porque está há anos à espera da aprovação da câmara. Um bairro com mais de 6000 pessoas, em que mais de 70% têm menos de 30 anos, a  única creche que existe, sobrevive nalguns pré-fabricados em segunda mão.
As hortas urbanas (que vemos à beira da ic19, têm sido destruídas pelo poder político com a desculpa de que não é seguro frequentar aquelas áreas (como se fosse seguro habitar aquelas casas). O comentário triste de uma das pessoas do bairro é que iriam certamente voltar a haver mais pessoas na tasca ao domingo. Para além de constituir mais uma forma de subsistência para esta gente, um bocado de terra pode significar um bom par de horas de exercício físico e mental.
70% desta população gosta de aqui viver. 80% defende a restruturação do bairro.
Às 7 da manhã do dia 3 de Outubro de 2009, depois de se considerar de extrema necessidade a construção de uma escadaria numa escarpa enlameada, estava já uma panela ao lume e o povo reunido. Às 7 da noite a escadaria estava pronta.


No final do seminário ouvi ainda Helena Roseta dizer que concordava com uma frase que tinha ouvido há uns anos da boca de um morador deste ninho: a Cova da Moura é um bairro histórico!


1 comentário:

Maria disse...

Epah.. Só agora é que vi o tamanho do post. Estava mesmo entusiasmada, espero que não esteja muito chato.