Lá por ser dourada não deixa de ser uma gaiola
Saíram clandestinos para fugir ao serviço militar que
durava seis anos, saíram porque em casa não havia sustento, saíram
porque foram expulsos dada à sua religião, saíram para escapar à
ditadura, saíram para fazer fortuna, saíram para exercer a profissão
para que estudaram, saíram à procura de uma vida digna. Desde o século
XVIII, saíram aos milhares de Portugal Continental, dos Açores e da
Madeira.
É uma gaiola de porta aberta e onde se permanece com
um pé fora e outro dentro, para sempre. Assim é, pelo menos o que
perceciono da experiência da emigração. Não sou emigrante, nem migrante e
por isso falo hoje como quem vê de fora. São-no vários dos meus amigos,
de diferentes gerações e por motivos distintos. Uns foram, outros foram
e voltaram, alguns pensam ficar, outros voltaram e não querem tornar a
sair, outros arrependem-se de ter voltado e outros não sabem.
Numa breve pesquisa que fiz em tempos com eles, as
saudades faziam-se sentir da família e das amizades, da comida, da
língua, da cultura e dependendo do país, do clima e da segurança.
Quando se está lá recorda-se o que cá se deixou mas, quando se chega cá
os sentimentos também se dividem, foi lá que ficou a casa, uma rotina
por vezes mais calma, os novos hábitos e comportamentos, aquilo que
agora também é parte da sua identidade. E os que regressaram reformados
lembram também com saudade os bons momentos que lá viveram.
A principal palavra que me ocorre quando penso em
(e)migração é coragem. Se hoje temos quem se aventure a novos mundos e
novas experiências porque sente essa vontade de evoluir pessoal e
profissionalmente, não deixamos de ter aqueles que partem de coração
triste, sem saber falar a língua do país de destino e às vezes sem saber
se têm onde dormir.
Mesmo no primeiro caso, aquele que é o de uma nova
geração bem preparada e remunerada com vontade de explorar novas vidas,
nunca considerei que emigrassem de ânimo leve e por isso continuo a
admirar a sua coragem. Sim, eu sei, o mundo mudou, temos que pensar
global e deixar a zona de conforto não é? A verdade é que nada disso é
novo para os portugueses. Pelas piores razões, cedo descobriram o
tamanho do mundo.
A Gaiola Dourada, de Ruben Alves, é uma
comédia que retrata uma dada vaga de emigração. Dedicado aos seus pais,
emigrantes em França, recupera certos estereótipos, certos linguajares,
certos comportamentos e uma certa vergonha que os filhos sentem dos
pais. Fala da possibilidade de concretizar mais cedo do que previsto o
sonho de voltar para Portugal e como ao fim de 30 anos, as respostas
fáceis se tornaram difíceis.
Há quem se tenha reconhecido, há quem se tenha
sentido ofendido. Esta crónica não é uma crítica de cinema, o filme cabe
aos leitores avaliar.
A mim deu-me para pensar, na vida e nas emoções das
gentes que partem, no seu esforço de adaptação, na atenção que lhes
reclama quem cá fica quando chegam de férias, nas chegadas e nas
partidas, nas descobertas de novos lugares e de novos amigos, nas suas
vitórias e nos seus sucessos. No parecer ser, tão português, no como a
comunidade emigrante se trata entre si e no pouco que sabe de nós quem
nos acolhe por esse mundo fora!
Lá por ser dourada não deixa de ser uma gaiola mas, para mim, é apenas perceção.
3 comentários:
é giríssimo! Estreou na Bélgica há mais de um mês e é fantástico. Talvez por viver num país também francófono e também com bastante emigração portuguesa, seja muito fácil o entendimento de todo o filme. aqueles olhos sempre tristes da Maria... dizem tudo! vai ver :)
beijinhos
Rafaela
Vi hoje! Gostei bastante: vê! :)
imperdível. consegues facilmente rebolar a rir como vens às lagrimas no momento seguinte.
D
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